A senhora, culta e nobre de sentimentos, dispondo de algum tempo livre, resolveu aplicá-lo de forma útil. Como o índice de suicídios na cidade onde residia era elevado, dedicou-se ao edificante trabalho de atendimento do S.O.S-Vida, serviço telefônico para os candidatos ao autocídio. Submeteu-se ao treinamento e, três vezes por semana, dedicava duas horas de seu dia, à relevante tarefa. Em uma ocasião, foi surpreendida por uma voz feminina amargurada e nervosa, que dizia: “pretendo matar-me ainda hoje. Antes de fazê-lo, quis comunicar minha decisão a alguém. Por isso, estou telefonando.”
Fiel ao compromisso de não interferir no drama do cliente, manteve-se serena, indagando: “acredita que eu possa lhe ser útil?”
Com azedume, a paciente reagiu: “ninguém pode ajudar-me, nem o desejo. Odeio o mundo e as pessoas. Sou uma infeliz e pretendo encerrar esta existência vazia.”
Como a senhora permanecesse em respeitoso silêncio a sofredora continuou sua narrativa.
“Sou rica. Resido em uma bela mansão, no melhor bairro da cidade. Tenho dois filhos: um homem e uma mulher, ambos casados e pais, que já me deram quatro netos. Sou membro da alta sociedade, freqüento ambientes luxuosos e requintados. Tenho tudo o que o dinheiro pode comprar. Mas sabe o que mais me irrita? Pois eu lhe digo: em minha casa disponho de duas linhas telefônicas. Sempre que a campainha soa e vou atender, trata-se de ligação errada. Ou seja, ninguém se preocupa comigo. Terminados os encontros formais, sociais, ninguém é meu amigo!”
“Então” – interferiu a senhora com habilidade – “permita-me telefonar-lhe uma vez ou outra.”
“Com qual interesse?” – perguntou a outra incrédula.
“Eu necessito de uma amiga.” – respondeu serenamente.
Fez-se silêncio por um instante.
“Mas você não me conhece.” – redargüiu, mais calma, a sofredora.
“Isso não é importante. Vou conhecê-la depois. Forneça-me o número de seu telefone, por favor.” – insistiu a senhora.
“Não tenho o hábito de dá-lo a estranhos.” – respondeu um tanto contrariada.
“E como deseja, então, que a procurem?”
Depois de um instante de hesitação, ela cedeu e informou seu nome e número telefônico.
Dois dias depois, a atendente telefonou para a desconhecida.
Conversaram sobre assuntos gerais.
A experiência repetiu-se muitas vezes.
Após alguns meses, resolveram conhecer-se pessoalmente em um café, e se tornaram amigas. Hoje, ambas trabalham no S.O.S-VIDA e o telefone, quando toca, é alguém pedindo socorro, no que sempre é oferecido com carinho.
Aprendeu a amar.
Tornou-se útil e solidária.
Curou-se da solidão que a consumia e torturava.
* * *
Recebe amor aquele que o doa.
Muitas vezes não o recebe da pessoa a quem o oferta. Isso, porém, não é importante, desde que ame.
A solidão é doença que decorre do egoísmo.
Quando alguém se dispõe a sair da concha do “eu”, enriquece-se de amor e de solidariedade.
(Equipe de Redação do Momento Espírita, com base no livro “Sob a Proteção de Deus”, de Divaldo Pereira Franco, texto ditado pelo Espírito Ignotus, cap. “Terapia da Solidariedade”, pp. 23/25, ed. Leal, 1998)
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